Americanos preparam tese de mestrado sobre ONG Enraizados, que ensina o ritmo
Rio – A Baixada virou referência mundial no ensino de hip hop. Primeira escola do estilo da América Latina, a ONG Enraizados, em Nova Iguaçu, é tese de mestrado da jornalista americana Jessica Diaz, de 23 anos. Acompanhada do namorado Jonathan David Horta, também de 23 anos, desde maio ela filma tudo o que rola na ONG do bairro de Morro Agudo, e analisa as nuances que o ritmo ganhou aqui.
“O hip hop no Brasil é diferente do americano, do francês. Aqui mistura com samba, com funk”, aponta ela, que planeja um documentário com suas conclusões ainda para este ano. “Volto no fim do mês, mas quero retornar para mostrar o filme.”
Eles não foram os primeiros a se deslocar de seus países para conhecer o trabalho da Enraizados. Franceses, tunisianos, chilenos e finlandeses, entre dezenas de outros estrangeiros, já estiveram na Baixada especificamente para conhecer a ONG. “Trabalhamos em rede, temos representantes em 12 países ao redor do mundo”, afirma Dudu de Morro Agudo, de 35, um dos fundadores da Enraizados.
5 MIL: número de jovens que já participaram das oficinas e cursos oferecidos pelo Enraizados
Nem só de rimas vive a ONG: quinzenalmente acontecem os saraus e as batalhas de rimas. “O objetivo é integrar outros tipos de cultura que existem na região”, afirma Dudu.
O poeta Antônio Feitoza, de 54 anos, sabe bem a importância de ter um espaço para sua arte. “Em 1982, Morro Agudo tinha vários encontros de poetas. Isso foi se perdendo com o tempo.” E lembra que, na época, ele e os amigos usavam um mimeógrafo para fazer cópias de seus contos. “O Enraizados trouxe isso novamente.”
Os resultados são visíveis. Em 15 anos, mais de cinco mil jovens já se formaram em cursos como DJ, Grafite, MC e Break. O rapper Einstein, de 18 anos, é um dos frutos da escola. Há dois anos venceu um concurso nacional e viu a carreira alavancar ao ganhar equipamentos para montar seu estúdio. “Não estamos nisso por moda. Rap é compromisso!”
Mudança após perda de patrocínio
Apesar da força de vontade e do trabalho na região de Morro Agudo, nem tudo são flores na história da Enraizados. No último fim de semana eles mudaram para uma sede menor, após o fim do patrocínio. “Não fomos expulsos, nem somos coitados. Tomamos essa decisão para podermos economizar dinheiro para um dia termos nossa sede própria”, conta Dudu. O processo de gentrificação e especulação imobiliária no bairro é apontado como dificultador para que o sonho de ter um espaço definitivo ainda não tenha saído do papel. “Um terreno em Morro Agudo está custando no mínimo R$ 160 mil.”
A diminuição do espaço físico com a mudança de sede, no entanto, não impede que os cursos continuem. “Daremos oficinas em locais parceiros. E saraus e batalhas, nos espaços públicos”, diz Luiz Carlos Dumontt, 43 anos, também coordenador da ONG.
Cientes da importância para a região, nem pensam em parar. “Moleques, que não tinham perspectiva de nada, viajaram o mundo, escreveram livros e gravaram CDs. O trabalho tem que continuar”, finaliza Dudu.
Por: Tássia Di Carvalho
Matéria originalmente publicada no Jornal O Dia [link]