Quando começaram as manifestações no Brasil, eu estava na França, participando de dezenas de atividades com instituições parceiras da cidade de Nancy. Eu e meus companheiros começamos a acompanhar tudo pela internet, o Dumontt era o que trazia mais novidades – e ainda é, contribuindo como podia, mesmo a milhares de quilômetros de distância. Sempre que possível conversávamos sobre os motivos que levaram ao início das manifestações, quem estava liderando, etc. As informações disponíveis eram confusas – e ainda são, porém não podíamos esconder a nossa felicidade em ver o nosso povo na rua, exigindo “nossos” direitos e fazendo história.
Pouco antes da nossa volta, recebi uma mensagem do Petter MC, via facebook, avisando da convocação para uma reunião na Universidade Rural, em Nova Iguaçu, onde seria conversado os detalhes da manifestação que aconteceria na cidade. No dia seguinte recebi uma mensagem da minha filha, de treze anos, via WhatsAPP, perguntando se poderia participar da manifestação que aconteceria na cidade.
Quando cheguei no Rio, dia 23 de junho, um camarada me questionou sobre a importância das manifestações na cidade de Nova Iguaçu, dizendo que todos de Nova Iguaçu deveriam, ao invés de se reunir na cidade, se juntar as manifestações que acontecem no Centro.
No dia 24 recebi uma ligação da Secretária Nacional de Juventue, Severine Macedo, me convidando a participar de uma reunião com a Presidenta Dilma, com representares de organizações de juventude. Publiquei um artigo falando sobre a reunião: Enraizados participa de reunião da Presidenta Dilma com a Juventude brasileira.
Tudo acontecia de maneira muita rápida, era difícil interpretar e analisar tanta informação, a única maneira era conversar com outro(as) camaradas. Era como pular de um precipício e ter que construir as asas no meio de caminho, como sempre diz o Dumontt.
Quando estávamos na França, o Léo da XIII quase que diariamente conversava com o Samuca Azevedo via facebook. A única “novidade” era que morria gente todos os dias na Cerâmica e em Morro Agudo. Mas nada era noticiado nos Telejornais e nos sites de notícias.
Há alguns meses o Movimento Enraizados trata com prioridade, juntos com outras instituições como a Casa Fluminense, a causa pelo “Fim do Extermínio da Juventude Negra”, pois Nova Iguaçu, onde é a sede do movimento, está no ranking “macabro” do Governo Federal como a terceira cidade do Rio de Janeiro mais perigosa pra um jovem negro viver.
Esse era o assunto que eu, e outros companheiros – todos de periferia, queríamos que entrasse na agenda de discussão com a Presidenta. Outras organizações sugeriram outros assuntos, e essa pluralidade, na minha opinião, é o que faz com que o máximo questões sejam levantadas e abordadas, acho legítimo e necessário, mesmo porque assim como o Enraizados não trata como prioridade diversas questões que são de extrema importância para a juventude brasileira, outras organizações também não o fazem em questões abordadas por instituições que atuam nas periferias brasileiras.
Quem acompanhou minhas postagens nas redes sociais, deve ter visto que tenho ido ao médico com frequência por conta de uma tendinite no joelho esquerdo. Foi justamente isso que me impediu de sair de casa no domingo e na segunda-feira, mas me permitiu “ler” bastante sobre as manifestações e entender algumas questões técnicas que eu defendia somente por instinto de sobrevivência, como por exemplo a “desmilitarização das polícias”.
Li um artigo do Túlio Vianna, na Revista Fórum, chamado “Desmilitarizar e unificar a polícia”, que me mostrou de forma quase que didático porque a polícia militar considera o povo seu inimigo. É um texto que acho que valeria a pena você ler.
Li a coluna do Caetano Veloso, no Jornal O Globo de domingo, cujo o título é “Gás”. Também traz uma narrativa interessante, sob um ponto de vista, não “caetanês”, mas de amigos “caetânezes”, onde diz o seguinte em um trecho: – Ele comenta o quanto ficou impressionado com um grupo representativo do movimento negro, formado de habitantes da Baixada, cujos cartazes exibiam estatísticas sobre a posição de desvantagem em que vivem os negros no Brasil.
Em outro trecho que me chamou atenção havia o seguinte: – A essa altura, temperamentos mais combativos queriam enfrentar a força policial e atacar o Piranhão. Impressionou meu amigo que o grupo de negros — que, além dos cartazes, exibiam marra de rappers e panos amarrados no rosto que deixavam apenas os olhos à mostra — tenha sido firme em dissuadir de praticar qualquer tipo de violência aqueles que tendiam a fazê-lo.
Quem não entende o porque de levantarmos a bandeira pelo “Fim do Extermínio da Juventude Negra”, basta pegar qualquer livro e pesquisar sobre a Baixada Fluminense, a primeira coisa que vai encontrar é que é uma região marcada pelo descaso e abandono do poder público. O que reflete em uma região violenta, onde quem mais morre são os jovens pretos. E afirmo que a coisa não está pior porque os movimentos sociais e culturais, atuam quase que de forma independente, com o objetivo de frear esse genocídio.
Muito bom. Fui professor em Ponto Chic e na Vila Nova, Ótimo artigo.
Valeu Sérgio!!!
Qual escola você foi professor??